«Uma das
preocupações centrais da actual
investigação sintáctica é a
caracterização do mapa de relações entre
significado lexical e forma sintáctica. Um aspecto importante
desse vasto assunto é o estatuto sintáctico dos
argumentos "subentendidos" ou "implícitos": será que um
papel temático "subentendido", inerente no significado lexical
de um verbo, corresponde sempre a uma posição
estrutural na representação sintáctica? Se
não, sob que condições pode o desajuste entre
significado e forma ser
tolerado?»
Luigi Rizzi
(1986)
Um dos domínios mais interessantes da Sintaxe é a
análise das categorias vazias, consideradas habitualmente como
sendo de dois tipos: vestígios de movimento e
posições vazias basicamente engendradas; o primeiro
tipo é exemplificado em (1a) e (1b), e o segundo em (2a) e
(2b):
(1)
a. Quei é que ele comprou [v]i
?
b. Os livrosi foram lidos [v]i
(2)
a. O Joãoi prometeu [v]i ir-se
embora
b. [v]i Abriui a porta.
Derivar a distribuição de estes tipos de elementos
vazios de princípios da gramática é uma das
metas da Teoria da Regência e da Ligação
edificada nos anos 80. Um dos princípios universais para isso
desenvolvido é o Princípio da Categoria Vazia
(Inglês Empty Category Principle --ECP) --Chomsky (1981,
1982). Este princípio define à partida as
condições de legitimação das categorias
vazias, isto é, as restrições da sua
distribuição. Quanto à
identificação dessas categorias, ou seja, o seu
conteúdo semântico, é admitido que o ECP define a
identificação dos vestígios em (1a) e (1b) e dos
pronominais em (2a) --embora não seja claro se também o
faz para o a posição vazia em (2b).
Outro tipo de construção para a qual a ideia de
categoria vazia tem sido evocada é aquela que aparece em
frases como (3):
(3) A Joana tem um carro verde e o
Paulo tem um [-] branco
O tipo de construção apresentado em (3) é
conhecido na gramática como elipse do nome, uma
construção caracterizada pela falta do elemento
nominal, aparentemente autorizada pelo contexto redundante do
enunciado. Na frase em (3), a elipse do nome carro
representa um desafio importante para identificar a natureza
sintáctica do nó vazio correspondente. Este tipo de
construção levanta algumas dificuldades teóricas
para a gramática generativa, nomeadamente o problema da
relação entre construções
elípticas e categorias vazias, como as anteriormente
apresentadas. Será a elipse uma categoria vazia? Será a
elipse nominal um nome vazio legitimado pelo ECP? A
relação de co-referência que intuitivamente
atribuímos a carro e à elipse em (3), é
a prova de que existem, nas línguas naturais,
processos anafóricos não relacionados com movimento de
constituintes. A elipse do nome aparece assim como um constituinte
sintáctico vazio, basicamente engendrado, identificado por um
antecedente contextual, como se ilustra em (4):
(4)
a. O projecto de lei socialista foi aprovado, mas o [e]
comunista foi chumbado
b. L'attentat a fait six blessés, mais deux [e] n'ont
pas survécu.
Põe-se a questão de saber a que princípios
obedecem a legitimação e a identificação
da categoria vazia elíptica. A análise
sistemática destes casos leva à conclusão que a
elipse forma uma classe sintáctica distinta, formalmente
caracterizada por determinadas condições gramaticais.
Parte-se do princípio que todas as categorias não
fonéticas --vazias e elípticas-- são sujeitos a
princípios universais de legitimação e de
identificação. Como veremos, a elipse do nome
levar-nos-á crucialmente a considerar a sintaxe numa
perspectiva configuracional, isto é, a defender que os
constituintes elípticos são basicamente engendrados na
posição que ocupam superficialmente, sendo as
posições na estrutura em que estão inseridos
assinaladas por uma categoria vazia.
Para responder às perguntas levantadas, tentar-se-á
nesta dissertação seguir o quadro geral da tipologia
das categorias vazias. O trabalho baseia-se em hipóteses
teóricas já clássicas --o ECP e Rizzi (1986)--,
e em investigações mais recentes sobre elipses
estruturais e legitimação de nomes nulos (Lobeck 1995,
Kester 1996 e Sleeman 1996).
A dissertação divide-se em três capítulos,
organizados da seguinte forma: no primeiro capítulo, a
noção de vazio linguístico, no qual se inclui a
elipse, é discutida numa perspectiva clássica, e depois
na sua integração no ECP; no capítulo 2,
são propostos alguns tratamentos sobre a elipse, mais
particularmente sobre os nomes nulos; no capítulo 3,
é analisado em pormenor o mecanismo de elipse nominal em
Português e em Francês, em diversas
construções envolvendo nomes vazios. Por fim,
formulam-se algumas conclusões e indicam-se as
referências bibliográficas.