Rio Paiva ...
Paiva, rio
inconstante de leito pedregoso e recurvado, típico curso de água de montanha
que ora nos mostra o seu lado rebelde de águas bravas, ora desliza mansamente
em trechos ídilicos. As grandes variações sazonais de caudal do rio, a
estreiteza e o acentuado desnível do seu leito provocam, em muitos sítios, o
aparecimento de rápidos, que fazem as delícias dos apreciadores de desportos
aquáticos radicais, os quais consideram o Paiva, muito justamente, um dos
melhores locais do país para a prática das suas actividades.
O rio Paiva está rodeado, em significativa parte do seu percurso, por uma
frondosa e luxuriante galeria vegetal, que alberga ecossistemas diversificados
e de grande importância. A faceta selvagem e agitada que tornou o Paiva
conhecido, por vezes dá lugar a uma completa transfiguração do seu carácter,
quando o rio atravessa zonas de mosaico agrícola. Surgem aqui as pequenas
aldeias ribeirinhas, criadas em estrita sintonia com o rio.
O segundo percurso tem como objectivo dar a conhecer ao viajante um pouco
deste rio, o menos poluído da Europa, mostrando as suas magníficas paisagens e
os seus povos, com as suas igrejas e capelas.
A vila ...
O nosso percurso inicia-se em Castro Daire. Trata-se de uma vila antiga originada num castro sobranceiro ao rio Paiva, o castro dos bons ares, daí o seu nome actual. Os Romanos passaram aqui com as suas vias. Outros povos também. Há memórias de pedra cuja leitura se faz como em museu. O rei D. Manuel I concedeu-lhe foral no ano de 1514. Igreja e capelas, palácios, o casario ordenado em praças e ruas, registam os passos de uma história fecunda e disponível.
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Antes
de abandonarmos a vila não podemos deixar de ver o Bairro do Castelo,
natural varanda aberta sobre o Paiva. Também a Igreja matriz, datada de
1735, com a sua fachada neoclássica, merece uma visita. Outro ponto de
interesse é a residência dos fidalgos da Casa da Cerca (Palácio das
Carrancas), celebrados por Camilo Castelo Branco no seu Amor de Perdição.
Perto desta, iremos encontrar o Solar dos Mendonças, a Câmara Municipal e
a Capela de S. Sebastião. O Miradouro do Calvário, amplo terraço povoado
por cruzes e sombreado de árvores, proporciona uma soberba paisagem ao
redor e compreende-se então que este era o sítio exacto para nascer um
grande povo. Resta-nos descer ate ao nosso meio de transporte e iniciar o
percurso. Não se esqueça de colocar a zero o seu conta-quilómetros.
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Seguindo a EN 2 no sentido a Viseu, cortar à esquerda à saída de Castro Daire,
para o nó de acesso à A 24. Na rotunda de acesso voltar à direita, seguindo a
placa Praia da Folgosa. Cerca de 600 m após este cruzamento, cortar à direita,
seguindo novamente as placas que indicam a Praia da Folgosa. Agora iniciamos
uma descida ate encontrarmos o Paiva.
Aqui, devido a represas parte naturais, parte feitas pelo Homem, o Paiva
amansa e alarga o seu leito, criando a única praia fluvial do concelho de
Castro Daire. O rio é atravessado, aqui e ali, por grandes pedras
rectangulares, mais altas que o leito, as poldras, substitutos das pontes.
Pode-se aproveitar para fazer um pequeno percurso pedestre ao longo da margem
direita do rio, subindo cerca de 1.5 km, sempre no meio da vegetação abundante
que acompanha o rio. A água é límpida e, se o calor apertar, convida a um
mergulho refrescante
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Para continuar o nosso percurso temos de voltar à EN 2. Para tal fazemos o caminho inverso ao que nos trouxe aqui, ate encontrarmos a EN 2. Aí seguimos rumo a Viseu
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Na
descida até à Ponte Pedrinha, podemos apreciar os viveiros de trutas do
nosso lado esquerdo, assim como o rio Paivó, que corre bem fundo no vale
ate se encontrar com o Paiva. |
A
actual Ponte Pedrinha, feita na 2ª metade do século XIX, veio substituir
uma outra que existia anteriormente, construída pelos Romanos,
permitindo a ligação de Lamego a Viseu, vencendo a barreira que o rio
Paiva representava. Recentemente foi descoberta uma pedra que afirma que
a ponte foi construída durante o governo do imperador romano de Caio
Júlio Casear.
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Após
admirar esta magnífica construção que continua a resistir ao tempo e ao
tráfego, retomamos o caminho pela EN 228, durante 700 m. Aí cortar à direita,
para EN 558, em direcção a Reriz.
Até chegar a Reriz aproveitemos para apreciar as densas matas de pinhal que
enchem a encosta esquerda do vale do Paiva, tão densas que só ás vezes nos
deixam espreitar para o rio que corre bem no fundo.
Em
Reriz, o Paiva deixa de ser um rio encaixado para traçar meandros
divagantes pelo meio dos terraços fluviais que ele próprio construiu. A
povoação aglomera-se por baixo e em redor da igreja matriz. Esta sofreu
várias reconstruções e possui alta torre sineira, da qual é possível
obter uma ampla panorâmica sobre o vale aberto, onde o milho é rei, e as
moreias surgem aos montinhos nas extremas dos campos, por entre os quais
corre o Paiva. Uma nota curiosa sobre esta igreja é as representações
das três virtudes teologais em forma de figuras femininas estampadas nos
altos: a Fé, a Esperança e a Caridade.
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Outros
locais a visitar em Reriz são a Cama da Moura, penedo em cuja base a fraga
deixou margem para uma possível sepultura antropomórfica, o Poço dos Abades, e
a oficina de cestaria do Sr. Adelino Pinto, na Pedra Furada.
Seguindo agora em direcção a Gafanhão, cortar a esquerda para Grijó. Grijó é
marcada pelo Solar de Grijó do Gafanhão, casa nobre dos finais do século XVIII
mandada construir pelo Reverendo Brás Luís Coelho que foi abade de Reriz,
construção que actualmente se encontra num estado ruinoso. No primeiro
cruzamento, à saída de Grijó, virar à esquerda para Gafanhão, e logo a seguir
cortar à esquerda novamente para o Monte das Cabeçadas, onde se encontra a
ermida de Nossa Senhora de Rodes.
Muito embora a Igreja Matriz de Reriz seja consagrada a S. Martinho, e
outros Santos existam e se venerem nestas paragens, a grande devoção das
gentes é sem dúvida à Senhora de Rodes. Para que se obtenha tempo
favorável aos afazeres agrícolas, a população leva a figura da Senhora
de Rodes, conforme as súplicas dos crentes, desde esta capela, no Monte
das Cabeçadas, até à povoação, e vice-versa.
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Se
chove muito levam-na para a Ermida para que o tempo amaine. Se, pelo
contrário, se sucedem as secas e a falta de chuvas, vêm-na buscar ao
Monte das Cabeçadas e levam-na para a Igreja Paroquial a fim que lhes
permita a água necessária à fertilidade das terras. É este o vaivém da
tradição popular da Senhora de Rodes.
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Agora que se conhece a tradição e a capela, voltamos
atrás pelo mesmo caminho. Durante a descida, à direita, obtemos uma
vista grandiosa sobre o curso do rio, rio que tornou os meandros
encaixados na serrania, correndo por um leito de rochas xistosas. Depois
de percorridos 1.8 km, no cruzamento para a Ponte de Cabaços, virar para
a esquerda, e continuar durante 1.4 km.
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No
termo do segundo meandro mais fechado que tem esta parte do curso, o
Paiva encontra as pontes de Cabaços. A ponte nova lado a lado com os
restos da ponte antiga, que como aliás o próprio lugar, onde as árvores,
sobretudo entre as duas pontes, se curvam de folhagem sobre a água de
uma tonalidade azul turqueza, tem algo de romântico. Antes da ponte, as
rochas abrem-se em pequenas frechas, que o rio torneia em babas brancas
já depois de ter passado um largo mas pouco elevado açude.
A Ponte de Cabaços é decididamente, um dos locais de maior magia e misteriosidade que o rio possui. |
Continuando no mesmo sentido, iremos ligar a Ester. Ao longo da estrada,
no meio de pinheiros e alguns eucaliptos, surgem vários sobreirais que,
resultado da orientação da encosta, atingem dimensões muito
consideráveis.
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Continuando sempre na mesma estrada, vamos subindo até encontrar a EN 225. Aí voltamos à direita e seguimos esta estrada durante 5.5 km até chegar a Pinheiro.
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O
Paiva em Pinheiro, alarga-se um pouco, dando espaço a que surjam alguns
campos de cultivo nas suas margens, mas nunca perde o vigor. Passar o
Paiva sempre foi uma dificuldade. Para superar este entrava existiam as
pontes, mas em Pinheiro há uma ponte peculiar.
Um pouco abaixo da Capelinha do Senhor dos Perdões, aparece a ponte de Pinheiro ou do “Brasileiro”, uma ponte com portagem. Um “Brasileiro” dos que eram comuns nestas paragens, voltou da emigração endinheirado. Comprou uma quinta do outro lado do Paiva, e como não houvesse passagem ou os caminhos de volta fossem ruins, tratou de erguer ali uma ponte. |
Da
emigração ficara-lhe a esperteza de tentar ganhar sempre um tostão ou
outro, e como a ponte não o servia só a si, mas a população em geral,
serviu-se de um estratagema antigo e estabeleceu a portagem. Quanto mais
não fosse, para pagar o custo da ponte, o que era justo. E é assim que
na Ponte de Pinheiro, mais chegados à margem esquerda, um de cada lado
do tabuleiro de cantaria, se erguem dois pilares, onde outrora se
fixavam as cancelas desta ponte de portagem e se cobrava a mesma.
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Seguimos então para a Ermida do Paiva. Seguindo a EN 225, durante 500 m, cortando à esquerda na primeira estrada, que nos levará até à igreja.
No
século XII, Frades Agostinhos ergueram, um tranquilo mosteiro no sítio
chamado Ermida do Paiva, verde, silencioso e manso. Deste mosteiro resta
a igreja, um singular monumento românico de transição.
Através do portal de três arquivoltas, sobrepujado por característica faixa axadrezada, entra-se no corpo do templo, com abóboda de berço quebrado e colunas de capitéis ornamentados. Modilhões ornados com motivos geométricos, vegetalistas e antropomórficos percorrem a cornija do exterior da nave, onde se encosta, a nascente, a cabeceira poligonal, com belíssimos capitéis historiados encimando colunelos nas arestas. Aarão Lacerda, estudioso apaixonado desta igreja, chamou-lhe “templo das siglas” devido à abundância de marcas de canteiro que enchem a face sul. |
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Resta voltar a Castro Daire. Seguindo a calçada, virando sempre à
direita, encontramos a EN 225. Aqui voltamos à esquerda e rumamos a
Castro Daire, continuando a ter por companhia o Paiva que corre sempre a
nosso lado.
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