ALGUNS DADOS HISTÓRICOS
A
flauta transversa, à semelhança de muitos outros instrumentos, chegou
à Europa no tempo do Império Bizantino.
Segundo David Munrow a flauta transversa pode ser encarada como a
racionalização do princípio da flauta de Pã (ou siringe), sendo a sua
expansão mais ou menos paralela ao declínio desta.
Durante a Idade Média a flauta transversa foi usada sobretudo como
instrumento militar na Suiça e na Alemanha. Daí de expandiu para
outros países sob o nome flûte allemande e Schweizerpfeife.
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FLAUTA RENASCENTISTA
A
flauta renascentista tinha tubo cilíndrico, com 6 orifícios para os
dedos e 1 orifício circular muito pequeno (à volta de 6 ou 7 mm) como
embocadura. Feita de uma única peça, tinha o grande inconveniente de
não poder ser afinada.
Várias fontes indicam que o consort de flautas era constituído
por três modelos, afinados a intervalos de quinta: soprano (em Lá),
tenor (em Ré) e baixo (em Sol), todos com a extensão de duas oitavas.
O baixo era por vezes feito em duas partes.
Todos
os tamanhos eram feitos de buxo, material preferido na época para
todas as madeiras, por ter as fibras muito juntas e uma massa
específica muito elevada, permitindo ainda um excelente trabalho de
torno. Ocasionalmente, o modelo soprano era também feito em vidro.
Ainda no século XIX dois construtores franceses eram conhecidos pelas
suas flautas e flautins em cristal!
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FLAUTA BARROCA
A
partir de 1650 dão-se modificações muito importantes: a flauta passa a
ser feita em 3 partes, introduzindo-se um novo orifício que é agora
tapado por uma chave, controlada pelo dedo mínimo da mão direita.
Segundo Johann Joachim Quantz estas inovações foram de origem
francesa.
Por
volta de 1680, provavelmente por acção da família Hotteterre (família
francesa de construtores de instrumentos de sopro e sanfonas), o
perfil do tubo é alterado: a cabeça permanece cilíndrica, mas as
outras duas partes passam a ser cónicas invertidas (com um ligeiro
alargamento na parte final). Este perfil apresentava diversas
vantagens:
- O
som produzido era mais doce.
- A
quantidade de ar necessária era menor.
- A
afinação, sobretudo no extremo agudo, era mais fácil.
- O
tubo não tinha de ser tão longo e, por isso, os orifícios podiam estar
mais próximos, ficando os dedos numa posição mais cómoda.
Esta
flauta era por vezes feita em marfim, mas o normal era ser em buxo com
anéis de marfim. Manteve-se em uso durante mais de um século, embora
de passasse a fazer em 4 partes, com o corpo médio dividido em 2, o
que permitia ao construtor determinar com muito mais rigor a forma
interna do tubo.
Relativamente ao século XVII não existe documentação suficiente para
se poder afirmar quem foram os responsáveis pelas modificações
apontadas. No entanto, sabe-se que tiveram origem num círculo de
construtores parisienses ligados à corte de Luís XIV e liderados por
Jacques Hotteterre.
Em
1707 Jacques Hottetere publica em Paris a obra Principes de la
Flûte Traversière, na qual ilustra a flauta transversa em 3
secções.
No
início do século XVIII o diapasão era extremamente variável, por vezes
até de localidade para localidade. Por isso usava-se na flauta
transversa um sistema de corps de rechange – conjuntos de
corpos alternativos, afinados a diapasões ligeiramente diferentes, que
substituíam a parte da flauta imediatamente a seguir à embocadura.
Em
1752 aparece o célebre Versuch einer Anweisung die Flöte
Traversiere zu spielen (“Ensaio sobre um Método para Tocar a
Flauta Transversa”) de Johann Joachim Quantz (importante compositor e
flautista), obra fundamental para o conhecimento não só da história da
flauta na primeira metade do século XVIII como também da estética e da
prática musical da época, em geral. Quantz atribui a si próprio a
invenção de uma junta deslizante que, variando o comprimento da
flauta, permitia a afinação em diferentes diapasões, substituindo o
complicado sistema de corps de rechange.
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Praticamente toda a música para a flauta transversa escrita durante o
século XVIII, como é o caso dos concertos de Mozart (1778) era
executada na flauta de uma chave, de excelente sonoridade, mas criando
dificuldades nas dedilhações e afinação em certas tonalidades.
Estes
problemas levaram ao aparecimento de 3 novas chaves: para o Fá natural
(que era sempre muito alto), o Sol sustenido e o Si bemol. Surge assim
a flauta de 4 chaves. Simultaneamente aumenta-se o comprimento do tubo
e juntam-se 2 novas chaves para obter o Dó sustenido e o Dó graves.
Esta inovação só se deve ter vulgarizado a partir de 1770
aproximadamente, sendo atacada por músicos como Quantz (para quem ela
arruinava o som da flauta). Mozart utiliza estas duas notas nalgumas
peças.
Assim
surge a flauta de 6 chaves, que tem já uma considerável liberdade de
modulação e permite tocar em qualquer tonalidade, apresentando menos
problemas de afinação que os modelos anteriores.
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No
início do século XIX surgem grandes virtuosos da flauta, cujos
concertos tinham grande sucesso, dando a este instrumento grande
popularidade: é o caso de Drouet, Furstenau, Nicholson e Tulou.
Segundo Anthony Baines, Charles Nicholson (m. 1837) foi o maior
flautista que a Inglaterra jamais conheceu. Em Londres, no período
entre 1820 e 1830, Nicholson tentou melhorar e corrigir a flauta
fazendo orifícios maiores; em 1831 Theobald Boehm (construtor de
flautas alemão e flautista profissional) ouviu-o tocar nessa flauta,
ficando impressionado com a sua sonoridade.
A
partir daqui Boehm repensou completamente a flauta em todos os seus
aspectos: perfil do tubo, número, colocação e tamanho dos orifícios,
etc.. Ao fim de um ano de longas experiências, surge então a flauta
Boehm, em que:
- Os
orifícios são tão largos quanto possível.
- Os
orifícios são praticados nos locais acusticamente correctos,
independentemente de ser ou não possível a mão humana atingi-los.
- Há
um complexo sistema de chaves para tapar todos os orifícios através do
qual a acção de um só dedo pode fazer com que sejam tapados vários
orifícios.
- Uns
orifícios são controlados por chaves em forma de anel (directamente
tapadas pelo dedo), outros são completamente vedados por uma
sapatilha, mas quando o executante não actua sobre elas todas as
chaves estão abertas (excepto a de Sol #).
- O
tubo é em metal (embora mais tarde se volte por vezes a usar a
madeira), o que aumenta a sonoridade e a torna mais “clara”.
A
nova flauta foi apresentada à Academia das Ciências em 1837, tendo
obtido um relatório muito favorável e sendo adoptada logo a partir de
1838 por J.-B. Coche, professor no Conservatório de Paris.
Os
primeiros modelos de Boehm são ainda ligeiramente cónicos, mas em 1847
ele apresentou o seu modelo de perfil cilíndrico, dando à cabeça uma
forma de curva parabólica muito suave.
O
êxito desta flauta foi enorme, tendo suplantado todos os outros
sistemas. Foi também adoptado ou inspirou alterações na mecânica das
outras madeiras.
Hoje,
em qualquer parte do mundo, a flauta que se usa é a flauta Boehm, quer
seja feita de madeira quer de metal.
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