NÃO NOS LIXEM NÚMERO 11 - JUNHO 1997

Alimentos geneticamente modificados

Começou a Invasão anunciada

A oposição aos organismos geneticamente modificados foi muito forte na Europa e surpreendeu os produtores americanos. Por exemplo, o secretário geral do EuroCommerce, uma associação comercial que representa mais de 1/3 dos grossistas e retalhistas alimentares da União Europeia, exigiu a separação da soja tradicional da manipulada geneticamente.

Por toda a Europa, os consumidores disseram não aos alimentos manipulados geneticamente. De acordo com uma sondagem realizada pela Market & Oppinion Research International (MORI), 78% da população sueca, 77% da francesa, 65% da italiana e da holandesa, 63% da dinamarquesa e 53% da inglesa, não concordavam com a afirmação de que "estavam contentes por comer alimentos manipulados geneticamente". Aliás, ressalta de um estudo realizado há algum tempo na Alemanha que 78% das pessoas interrogadas eram contra uma alimentação derivada da alteração genética. Na Bélgica, uma outra sondagem revelou que 41% das pessoas interrogadas já tinha ouvido falar do problema e que 67% não comprariam alimentos que contenham organismos manipulados geneticamente.

"Novel Food"

Em resposta à inquietação dos consumidores, o Parlamento Europeu aprovou, no passado dia 16 de Janeiro, uma directiva chamada dos "Novel Food" com o objectivo de garantir a segurança da população europeia face à introdução de alimentos modificados geneticamente nos mercados da União.

Quer-nos parecer contudo que esta resposta constitui sobretudo uma manobra para descansar o consumidor. Em primeiro lugar, o alcance desta directiva é limitado uma vez que não se aplica a várias vias de utilização dos produtos resultantes da manipulação genética. Em segundo lugar, é inquietante verificar que os critérios e procedimentos de exame a que serão submetidos os "novos alimentos" não estão clarificados na directiva. Em suma, foi lançado com essa directiva um alerta a propósito dos alimentos resultantes da manipulação genética, mas que alerta? Um alerta que, mais do que esclarecer o consumidor apenas lançará a confusão. Por exemplo, refere-se apenas aos organismos geneticamente modificados vivos e identificados comprovadamente como tais. Aliás, não haverá pura e simplesmente nenhuma etiquetagem obrigatória num produto transgenético que seja considerado como "substancialmente equivalente" a um produto já existente. Os tomates transgenéticos, por exemplo serão etiquetados, mas o ketchup não!

A Soja e o resto

Depois do caso da "Soja", a comissão europeia autorizou a importação e a cultura na Europa de um milho transgenético pela firma CIBA-GEIGY; e mais dez pedidos referentes a colza, chiocória e diversas variedades de milho transgenético estão em análise. A multinacional Monsanto e outras anunciam o lançamento de beterrabas, batatas, bananas, uvas (pobre vinho!) bem como animais modificados geneticamente. Como se vê, a soja geneticamente modificada era apenas a primeira de uma longa lista do que se chama "ilusões" genéticas, quer dizer, já não batatas ou bananas, mas organismos com patrimónios genéticos "arranjados" pelo homem, que lhes enxertou um gene de bactéria, ou de vírus, ou de escorpião... ou um gene humano.

Multiplicação dos riscos

Considerados individualmente, cada um dos organismos transgenéticos já cultivados ou em vias de o ser levanta um ou vários problemas de segurança imediata: encorajamento a uma utilização acrescida de pesticidas, propriedades alérgicas, transferência de resistência aos antibióticos para bactérias patogénicas...

A cada receio, os industriais da engenharia genética respondem com uma alegre garantia da inocuidade dos seus produtos. Como se não pudessem enganar-se. Recorde-se entretanto que treze dos quinze países da União Europeia, baseados no parecer do seu comité científico nacional, se opuseram à introdução do milho da CIBA-GEIGY na Europa... antes de a própria Comissão a aceitar sem restrições.

Quem tem razão? É difícil responder. Quem irá lucrar? Nós não. Mas quem pagará as favas em caso de erro?...

Para além da discussão do caso a caso, é necessário recordar sistematicamente que existem argumentos fundamentais contra a libertação no ambiente de organismos geneticamente modificados. Para começar, nenhum destes organismos lançados até ao presente no nosso meio ambiente apresenta vantagens concretas para os consumidores. Depois há que sublinhar que a libertação para o meio de um organismo saído da manipulação genética e capaz de reprodução é irreversível. Acontece que não se pode prever como se comportará um organismo artificialmente criado num ambiente que o não seleccionou...

Marcha-Atrás

Sabe-se hoje que a "Revolução Verde" dos anos 70, baseada na monocultura, na mecanização e no uso massivo de pesticidas e adubos químicos, é responsável pela perda de 95% da biodiversidade agrícola, pela fragilização dos ecossistemas rurais e por uma boa parte da dependência económica dos países pobres em relação aos países industrializados. Hoje, sabemos também que a agricultura não deve produzir mais, mas produzir melhor. A esta luz, uma agricultura do futuro baseada num punhado de organismos patenteados, propriedade de algumas grandes firmas agro-químicas, apresenta-se como uma marcha-atrás, ou antes, como uma tentativa para manter uma penhora muito lucrativa sobre os recursos agrícolas mundiais.

Enfim, para além do simples problema agrícola, perguntamo-nos quem ganhará com fazer passar a natureza e os organismos que a compõem de um estado de "património natural" a um estado de dependência em relação a interesses privados. Colocar a questão é responder-lhe.

Pierre Coulon
in Greenpeace Magazine 1/97

Áustria, Luxemburgo e França reagem

Os governos austríaco e luxemburguês acabam de tomar a decisão histórica de se opor a nível nacional à autorização concedida pela Comissão Europeia para introduzir o milho modificado pela firma GIBA-GEIGY na União.

Considerando que os riscos para a saúde dos seus cidadãos e para a segurança do seu ambiente não foram correctamente avaliados pelas autoridades europeias, a Áustria e o Luxemburgo utilizaram o artigo 16 da directiva europeia 90/220 que lhes permite pedir uma revisão do dossier e proibir temporariamente a importação do produto incriminado para o seu território. É a primeira vez da história da União Europeia que este procedimento é utilizado. A nível político ele traduz o estado de inquietação dos consumidores e de incerteza dos peritos científicos face à introdução na Europa dos organismos cujo património genético foi artificialmente modificado.

A França, por seu lado, decidiu em 12 de Fevereiro proibir a cultura de sementes de milho transgenético. Trata-se de uma reviravolta total, tanto mais que o governo francês tinha aceite, poucos dias antes, a venda de milho transgenético, desde que fosse etiquetado.



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