TALÁBRIGA

( Texto em destaque em http://www.cm-agueda.pt/ e para aqui copiado em 2005-10-20 )

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Sob esta designação é referido por Plínio um povoado fortificado de dimensões significativas, localizado a sul do rio Vouga e que teria sido palco de sangrentas acções militares, no quadro das campanhas de pacificação de Décimo Junio Brutus, por alturas do ano de 136 a. C.

Tal citação de Plínio, que se transcreve na íntegra “A Durio Lusitania incipit. Turduli Veteres, Paesuri, flumen Vagia, oppidum Talabriga, oppidum et flumen Aeminium”, aponta a localização de Talabriga a sul do Vouga, o que levanta várias questões dada a ambiguidade do texto em causa.

Tal ambiguidade levou a que desde o séc. XVI, diversos autores tenham proposto soluções várias para a localização da Talabriga pliniana, não sendo ainda hoje pacífica a sua localização, à falta de elementos precisos.

Descartando muitas das hipóteses inverosímeis apresentadas pelos vários historiadores que se dedicaram ao tema, aquelas que merecem uma atenção mais relevante, são sem dúvida as que defendem a sua localização no “oppidum” da Branca (Souto) e as que defendem a sua localização no designado Cabeço do Vouga pois em ambos os locais existem vestígio romanos.

Contudo, dos vestígios arqueológicos reconhecidos, até à data, nada permite inferir da sua localização em um dos arqueosítios referidos.

Se em Souto da Branca os trabalhos arqueológicos mínimos aí realizados revelaram a existência de uma ocupação romana, sem estruturas significativas, já o mesmo não acontece com os vestígios arqueológicos do Cabeço do Vouga, em particular no monte designado por sítio da Mina – plataforma sul, voltada ao rio Marnel.

Aqui, de resto um ponto do Cabeço do Vouga onde desde 1996 se têm efectuado estudos sistemáticos, está-se em presença de uma ocupação continuada da plataforma, desde o II milénio a. C. até ao séc. VI/VII da n. E.

Considerando a ocupação pré-romana da Idade do Ferro e a ocupação romana, está-se em presença de um povoado clássico, com construções circulares e sub rectangulares, idêntico ao que se verifica em outros povoados castrejos a norte do Mondego, a que se sobrepôs a influência romana, como arqueologicamente está demonstrado, desde o séc. I a. C./I d. C.

É, de resto, nesta época que se assiste à construção da grande plataforma artificial tipo, criptopórtico sem pórtico, sobre o qual se irão construir as primeiras edificações romanas mas, será entre o séc. III e o séc. IV da nossa era que toda a plataforma irá sofrer uma revolução arquitectónico-estrutural completa, com a construção dos dois conjuntos de contrafortes e de um templo, de que se tem vindo a exumar vários vestígios significativos, entre várias outras alterações de conjunto.

Independentemente da monumentalidade das ruínas existentes no sitio e do acervo dos materiais arqueológicos já recolhidos, nada aponta para que se situe aqui a localização da Talabriga das campanhas militares de Décimo Junio Brutus – os níveis arqueológicos não nos “falam” de batalhas significativas, nem de dramas em larga escala, nem de arsenais de armamento, nem de tesouros numismáticos, pelo contrário, tudo aponta para que o sítio da Mina do Cabeço do Vouga, tenha sido um entreposto comercial significativo, em que a produção e a circulação de bens como a olaria, a par de outras actividades como a fiação, a tecelagem e o curtume de peles, desempenharam um papel de grande relevo.

Da Talabriga nem rasto mas, como todos os mitos, nunca desaparecerá das memórias colectivas das populações, tanto mais que, para o caso em presença está vivificada por uma vitimização que roça o heróico – a resistência de um povo perante a máquina militar do “invasor” romano. Daí que no subconsciente colectivo, continue a estar sempre presente a Talabriga bimilenar do Baixo Vouga.

 

Comentário a este texto

por Luís Seabra Lopes

O texto supra não está assinado, mas, dado ser divulgado através do sítio da Câmara Municipal de Águeda, é um texto formalmente da responsabilidade dessa câmara e, na prática, terá sido preparado pelo respectivo Gabinete de Arqueologia e História (GAH/CMA). Como se vê pelas sucessivas notícias aqui recolhidas, o GAH/CMA tem tido uma posição equívoca sobre a questão da localização de Talábriga e, em particular, sobre a sua identificação com as ruínas romanas do Marnel. Umas vezes inclinam-se para atribuir essas ruínas a uma suposta cidade de Vacca. Outras vezes inclinam-se para as atribuir a Talábriga.

Desta vez o toque é: "nada aponta para que se situe aqui a localização da Talabriga das campanhas militares de Décimo Junio Brutus". Só que falta fazer uma importantíssima distinção. Na verdade, está provado que existiram pelo menos duas localidades com o nome de Talabriga, uma situada na região do rio Vouga e outra na região do rio Lima. Não sendo feita esta distinção, o texto naturalmente resulta equívoco. O facto de não se encontrarem no Marnel vestígios arqueológicos das campanhas de Brutus em nada obsta a que as ruínas do Marnel possam ser atribuídas à Talábriga do Vouga. A inexistência desses vestígios poderá, sim, contribuir para situar as campanhas de Brutus na Talábriga do Lima.

O último parágrafo expressa outro equívoco, o de que o mito das campanhas de Brutus "nunca desaparecerá das memórias colectivas das populações". Ora a verdade é que este mito não faz parte da memória colectiva da população do Baixo Vouga. Esse tema foi apenas aflorado por alguns eruditos e estudiosos, e apenas a partir do início do século XX.

2005-10-20