Caros amigos coleccionadores de pacotes de açúcar. Das dezenas de mensagens que recebo diariamente, uma das temáticas mais repetidas tem sido qual o nome que se dá ao coleccionador de pacotes de açúcar. Ou seja, o que somos afinal...

Não sendo eu um entendido nesta área, tenho dialogado com diversas pessoas de diversas áreas de coleccionismo e mesmo professores de Português, Grego e Latim.

Para apoiar o resultado das minhas conversas neste distintos quadrantes, encontrei um texto, já publicado no Pacotim (Revista semestral do CLUPAC), onde esta definição é minuciosamente estudada.

Deixo aqui a transcrição do artigo na sua totalidade para que possam ter também uma opinião:

 


 

Crise identitária e a importancia dum prefixo

 

Não sei se terá alguma relação com o facto dos 40 se aproximarem vertiginosamente, mas dei comigo a matutar:

- Mas afinal... o que é que eu sou? Será que estou a atravessar uma crise de identidade?

Passo a explicar. Este sentimento prende-se com o facto de constatar que nós, coleccionadores de pacotes/embalagens de açúcar, não conseguimos ainda fazer vingar a utilização generalizada de um termo que defina o coleccionismo que praticamos, quer na comunicação inter-coleccionadores, quer na divulgação deste passatempo à sociedade. A identidade verbal faz parte do processo de consolidação deste coleccionismo. Nomear é invocar uma essência, é o substancializar da coisa.

Neste contexto, é imperioso trazer à colação o artigo do nosso colega J. M. Pereira publicado no nº 1 deste boletim (Pag. 8), que identificou a importância de um rápido “baptismo” e, depois de estudar esta problemática, apresentou como propostas as designações “Glicopacofilia”, “ pacoglicofilia” ou, simplesmente, “Glicofilia”. De entre as três propostas, J. M. Pereira elegeu a designação “Glicofilia” como a que, no seu entendimento, mais se adequaria, atendendo à estética da própria palavra, à facilidade de pronúncia e ao facto de já ser utilizada por alguns de nós.

Ora, sem querer estar a promover um “crisma” ou ser acusado de estar a abordar um tema requentado, gostaria de deixar aqui a minha reflexão, dado não me rever por inteiro na designação proposta. Em primeiro lugar, e tal como referiu J. M. Pereira, o que apreciamos e coleccionamos é, objectivamente, a embalagem e não o açúcar. Aliás, a trabalheira que dá à esmagadora maioria dos coleccionadores retirar o açúcar! Adicionalmente, são conhecidos diversos casos de coleccionadores que despertaram para este passatempo exactamente pelo facto de não gostarem de açúcar no café e dessa forma terem acumulado grandes quantidades de pacotes. Assim, defendo que a designação “Glicofilia” seja precedida de um prefixo explicitando que o objecto da colecção é a embalagem e não o conteúdo.

Depois de alguma procura cheguei ao prefixo “peri” que exprime a ideia de “à volta de”, “o que envolve” (do grego perí , “ao redor”). Parece-me um prefixo mais adequado que “paco” (de pacote) dado os pacotes serem apenas uma das formas de embalagens de açúcar que se podem encontrar (a mais representativa, porventura) e ainda pelo facto de “paco” não ser na língua portuguesa um prefixo que assumidamente queira significar “pacote” ou “embalagem”. Desta forma chegaríamos ao termo “Periglicofilia”. À primeira vista até pode parecer estranho a alguns, mas não será essa a sensação que se tem sempre que se cria um nome? Com a utilização os novos nomes começam a soar mais familiares. Complicado, dirão outros. Mas o que se poderia dizer da “Cartosignopaginofilia” (colecção de marcadores de livros em cartão) ou da “Eurocambiolenticulofilia” (colecção de conversores lenticulares de Euros)?!

Partindo do pressuposto de que coleccionadores de outros países teriam já passado por este problema, decidi fazer uma pesquisa na Internet sobre o assunto. Para grande surpresa minha, percebi que em França, e inclusive no âmbito do Clube Francês, a palavra “ periglycophilie” era já adoptada. Por vezes é feita a distinção entre “glycophilie” e “periglycophilie”, designando, respectivamente, o coleccionismo de embalagens de açúcar cheias e a vazias. Sendo o Francês uma língua de raiz igualmente latina e França o país em que o coleccionismo de embalagens de açúcar se encontra mais consolidado, organizado e desenvolvido, poderemos importar daí alguma experiência de quem já desbravou caminhos que em Portugal começamos agora a calcorrear. Contudo, discordo da atribuição de designações diferentes para as modalidades com e sem açúcar, pois, independente desse aspecto, a embalagem mantém-se como o objecto de interesse.

Os mais rigorosos nestas coisas da língua podem argumentar que a referência “glico” é inadequada devendo adoptar-se em alternativa “sacaro”, uma vez que o açúcar quimicamente consiste em sacarose e não glicose. Nesta perspectiva, poderia até ser sugerida a designação “Perisacarofilia”. No entanto, etimologicamente “Glico” (do Grego glykñs ) significa “Doce” o que, sem dúvida, dá sustentabilidade à versão “Glico”.

Em síntese, proponho a designação “ Periglicofilia ” que resulta de perí (do grego, “ao redor”) + glico (do grego glykñs , “doce”) + filia (do Grego phílos , “amigo”).

Vá lá, peguem no vosso dossier preferido, coloquem-se em frente ao espelho e repitam 10 vezes “Eu sou um Periglicofilo”. Já está? Estão a ver, até soa bem.

Por fim, parecer-me-ia adequado que se discutisse esta questão numa Assembleia-Geral do CLUPAC.

Setembro 2004

Mário Pacheco (Sócio CLUPAC nº 8)

 

Retirado do site Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

Tema

Um neologismo para «cole(c)cionismo de pacotes de açúcar»

Pergunta/Resposta

   

Se o termo “numismática” se refere ao coleccionismo de moedas, se o termo “filatelia” se refere ao coleccionismo de selos, qual será a designação mais correcta que se deve dar ao coleccionismo de pacotes de açúcar? “Periglicofilia”, “filoglicopacolia”?
    Obrigado pela atenção dispensada.

Carlos Sousa
Vale de Cambra

 

   A criação do termo para «cole(c)cionismo de pacotes de açúcar» começa logo pela tradução de pacote em grego antigo. Não me foi possível encontrar o elemento de formação “-pacolia” em nenhum dicionário. Sendo assim, parece-me, por enquanto, que o termo mais adequado é “periglicofilia”, porque apresenta elementos de formação de origem grega que são usuais em português, a saber (ver Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa ): peri- , do grego ‘perí, «em torno de»; glic(i/o)- , do grego ‘glukus, eîa, ú, «doce»; e filia , do grego ‘phílos, e, on', «amigo», associado ao sufixo formador de nomes abstra(c)tos -ia .

C. R. 08/03/2006

 

 

Hélder Bernardo (Sócio CLUPAC 136) - 8 Março 2006