No quadro da Teoria da
Regência e da Ligação (TRL) --a teoria dominante
nos anos 80 em Gramática Generativa--, as noções
anteriormente referidas mantêm uma certa importância. Tal
filiação poderá ser vista como baseada nas
intuições deixadas pela gramática
clássica sobre o vazio elíptico, embora não haja
obviamente nenhuma continuidade metodológica a concluir.
Note-se que a terminologia clássica desenvolvida à
volta do sub-entendido contribui para o actual quadro formal. Embora
não haja em termos descritivos qualquer continuidade entre os
pressupostos dos modelos respectivos, as abordagens, no quadro da
TRL, do problema da elipse, mencionam de facto dois momentos
básicos semelhantes aos tradicionalmente referidos: a elipse
implica sempre um duplo processo, sendo o primeiro o autorizar
um vazio, e o segundo o restituir esse vazio. Quer seja
motivado por uma operação de apagamento, quer seja
basicamente engendrado, esse vazio implica pois a existência de
condições de legitimação
especificamente definidas no âmbito da gramática, e a
sua restituição implica a possibilidade de atribuir
identificação ao termo elíptico, isto
é, de "remediar" o que está em falta[22].
A diferença entre a configuração
observável e a estrutura subjacente permite concluir que
existem sempre na oração final indícios
suficientes para permitir restituir a estrutura linguística de
base. Sendo assim, quer os movimentos efectuados, quer os
constituintes lacunares devem poder ser recuperados.
[23]
Do ponto de vista filosófico, o conceito de categoria vazia
não é pacífico: parece introduzir uma
solução de facilidade para reduzir a complexidade no
domínio das línguas. A afirmação da
existência de um vazio categorial pode soar a alguns como
escandalosa[24],
porque constitui uma fonte de indeterminação num modelo
em princípio caracterizado pelo seu rigor formal. O
próprio Chomsky apercebe-se da necessidade de reafirmar a
existência de categorias vazias quando refere, por exemplo, que
"se o movimento não deixasse uma categoria vazia
(vestígio), então estes fenómenos continuariam a
ser um mistério", e que "a hipótese de que o movimento
deixa um vestígio é, pois, empírica e é
apoiada por evidência do tipo da que apresentámos."
(Chomsky, 1986b:124). De modo geral, Chomsky qualifica as categorias
vazias de assunção, e as provas da sua
existência de evidência.
[25]
Raposo (1992:336) cita o seguinte texto de Chomsky: "[as]
propriedades [destas categorias] dificilmente podem ser
determinadas indutivamente a partir de fenómenos
visíveis observados, e portanto reflectem presumivelmente
recursos internos da mente."
Até que ponto a elipse corresponde a uma categoria vazia?
Esta questão deve ser posta na medida em que o modelo de
categoria vazia desenvolvido por Chomsky na TRL, visa essencialmente
os vestígios, cópias nulas de constituintes
movidos, e que alguns testes permitem ver como certo tipo de
anáforas nulas, como em:
(4)
a. Eu não sei o que a Maria comprou [-] na loja
(vestígio de Wh)
b Quem é que a Maria viu [-] ontem? (vestígio
de Wh)
C. O livro foi lido [-] pelo autor (vestígio de
NP)
A posição vazia assinalada em (4a.b) corresponde a um
vestígio de Wh, também referido como variável, e
em (4c) representa um vestígio de NP. São
vestígios na medida em que ambos resultam de um movimento. O
antecedente de um vestígio de NP move-se para uma
posição argumental, sendo o movimento geralmente
motivado por uma atribuição de caso. O antecedente de
um vestígio de Wh move-se para uma posição
não argumental, em princípio para [Spec,CP],
onde desempenha o papel de operador da variável assim
criada, função relevante na FL .
Na medida em que se assumem elementos zero como fazendo parte activa
da gramática das línguas naturais, deve também
assumir-se a capacidade do locutor em saber distinguir e posicionar
esses elementos nas representações que constrói,
isto é, em dispor de princípios e parâmetros para
legitimá-los e identificá-los. Como
veremos, do mesmo modo que os elementos plenos, os elementos nulos em
questão não podem aparecer em quaisquer
configurações, ocupar quaisquer posições.
Assim como as categorias plenas, também as categorias vazias
devem ser legitimadas e identificadas, isto é, obedecer a
restrições distribucionais e receber conteúdo
semântico.
Embora o conceito de categoria vazia esteja, como vimos, parcialmente
ligado ao subentendido da gramática clássica, só
faz verdadeiramente sentido numa teoria como a gramática
generativa. De facto, em Chomsky (1973), aparece a ideia de que
qualquer elemento deslocado deixa um vestígio de si
próprio na posição de origem, que fica regido
pelo elemento deslocado e é com ele co-indexado. Esse
vestígio é uma cópia do original, tendo em
princípio todas as suas propriedades, menos a forma
fonética.
No âmbito da TRL, vários módulos da Teoria exigem
a presença desse vestígio na
representação sintáctica. Sendo a categoria
vazia de natureza imperceptível, o seu princípio deve
ser completado por meios que permitem atestar a sua existência.
Dois desses meios são o Princípio de
Projecção e a Teoria X-barra. No primeiro caso,
assume-se que as estruturas sintácticas são
determinadas à partida pela estrutura de
subcategorização dos itens lexicais, isto é, tal
estrutura é projectada em sintaxe, onde, em conjunto com os
requisitos da Teoria X-barra, corresponde a determinada
configuração, e implica a presença de
determinados nós. Se acontece que, durante a
derivação, um argumento está em falta, e que a
estrutura se revela incompleta, então, de maneira a preservar
a referida estrutura, deve supor-se a sua presença,
imperceptível na Forma Fonética, sob forma de categoria
vazia. A teoria dos vestígios é uma consequência
do Princípio de Projecção, na medida em que as
propriedades de subcategorização dos itens lexicais
têm de ser verificadas em todos os níveis da
representação, pelo que, no caso de haver movimento, um
vestígio tem necessariamente de ocorrer na
posição de origem. A configuração
sintáctica na qual um item lexical é inserido é
pois directamente determinada pelas suas propriedades
temáticas. Do Princípio de Projecção,
Chomsky (1981) dá a seguinte formulação:
(5) Princípio de projecção
As propriedades de marcação temática de cada
item lexical devem ser representadas em cada nível
sintáctico: em FL, Estrutura-S e Estrutura-P.
Chomsky (1986b:97) refere que "uma consequência do
Princípio de Projecção é, em termos
informais, o facto de, se um elemento for «interpretado»
como ocupando uma dada posição, esse elemento ter de
estar aí na representação
sintáctica, quer como uma categoria evidente que está
foneticamente realizada, quer como uma categoria vazia, à qual
não é atribuída forma fonética." Vejamos
o exemplo seguinte, caso de movimento do objecto para
[Spec,IP] na passiva: a posição de objecto
directo do verbo roubar, que exige um argumento interno,
é agora ocupada por um vestígio, já que o NP
objecto se elevou na estrutura até [Spec,IP] onde
recebe Caso Nominativo:
(6) [IP [O carro]i foi roubado
vi esta noite]
No quadro da TRL afirma-se um princípio geral e
propõe-se uma tipologia para as categorias vazias. Em Chomsky
(1981), sugere-se que uma categoria vazia é um nó
desprovido de conteúdo fonético, e que existem
vários tipos de categorias vazias, dependendo das suas
propriedades sintácticas e da sua sensibilidade aos
vários módulos da teoria, em particular aos
princípios da Teoria da Ligação (TL). A TL
(Chomsky 1981, 1982), estipula três tipos de NPs plenos, isto
é, foneticamente realizados: anáforas, pronomes e
expressões referenciais. Esses NPs podem eles próprios
ser vistos como a combinação de dois traços
primitivos, [± anafórico] e [±
pronominal], combinação essa que dá origem a
quatro tipos de NPs caracterizados por associações de
traços diferentes:
(7)
a. [+anafórico]
[- pronominal] (anáforas) Combinação
de traços Categorias
plenas Categorias
vazias [+anafórico]
[-pronominal] anáforas Vestígio de
NP [-anafórico]
[+pronominal] pronomes pro [-anafórico]
[-pronominal] expressões
referenciais vestígios de
Wh [+anafórico]
[+pronominal] PRO
b. [- anafórico] [+pronominal] (pronomes)
c. [- anafórico] [- pronominal]
(expressões referenciais)
d. [+anafórico] [+pronominal]
Assim, os constituintes que têm os traços em (7a)
são conhecidos como anáforas, e são por
exemplos os reflexos simples. A combinação em (7b)
refere por seu lado os pronomes em geral, como ele,
tu, etc. Quanto à combinação em (7c),
podemos aplica-la às expressões referenciais em geral,
aos NPs, como o gato, ou o João. Se as
combinações (7a.b.c) são facilmente associadas
aos três tipos de NPs anteriormente referidos, a quarta levanta
sérios problemas, já que a associação
desses dois traços marcados positivamente parece à
partida contraditória. Embora não haja NP pleno que
satisfaça a combinação (7d), há, como
veremos, um NP vazio que o faz, e que será identificado como o
pronome anafórico nulo PRO.
Põe-se também a questão de saber se o mesmo tipo
de combinações de traços é relevante para
descrever os elemento nulos, o que seria desejável em termos
de simplicidade da teoria gramatical. Além disso, há
que determinar se as categorias vazias são simplesmente
variantes vazias das categorias plenas, e, em especial, se uma
categoria vazia também é possível onde o
é uma categoria plena, e vice-versa. Com base nos
traços [± anafórico] e
[± pronominal], as categorias não
foneticamente realizadas podem ser integradas numa tipologia.
Chomsky (1986b:169) elabora um paralelo entre as
combinações relevantes para categorias vazias e
categorias lexicalmente realizadas. Esse paralelo é resumido
no quadro em (8), e para a sua completa justificação,
remete-se para Chomsky (1982, 1986b), Duarte (1987), Brito (1988) e
Raposo (1992):
(8) Tipologia dos NPs
Interessam-nos aqui em particular as categorias vazias pro e
PRO. A primeira em tudo se assemelha a um pronome pessoal --pode
substituir um NP referencial--, sendo simplesmente não
pronunciável. Desde Rizzi (1986), assume-se que em algumas
línguas --chamadas pro-drop--, como o Italiano, onde os
pronomes plenos são opcionais em frases flexionadas, a
posição sujeito é ocupada por um pronome nulo de
tipo pro. Também se refere pro para ocupar a
posição de objecto opcional (Rizzi 1986), e em alguns
casos, que não vale a pena aqui desenvolver, para justificar o
sujeito das formas imperativas do verbo.
Além disso, pro é apontado nesse tipo de
línguas como sujeito dos verbos meteorológicos, sendo
neste caso um pronome não argumental. Esses verbos não
têm papel temático a atribuir. Se nas línguas sem
sujeito nulo, esses verbos devem sempre manifestar um sujeito pleno,
embora meramente expletivo --Francês il, Inglês
it, Alemão es--, nas línguas
pro-drop pode supor-se que essa posição é
ocupada por pro. [31]
Nos exemplos seguintes, encontramos alguns dos usos de pro
anteriormente referidos:[32]
(9)
a. pro Procuro o João
(pro sujeito argumental)
b. pro Choveu toda a noite (pro não argumental
expletivo)
c. Questo conduce pro alla seguente conclusione (pro
objecto arbitrário)
A combinação de traços,
[+anafórico] [+pronominal], que não
equivale a nenhum NP lexicalmente realizado, é habitualmente
associada na TRL a PRO. Este elemento é ao mesmo tempo uma
anáfora e um pronome, obedece portanto ao mesmo tempo ao
Princípio A e ao Princípio B da TL, sendo pois ao mesmo
tempo livre e ligado na sua categoria de regência, o que
é obviamente contraditório. A maneira de resolver este
dilema é de postular que PRO não é regido nem
pode sê-lo e não tem portanto nenhuma categoria de
regência, o que é resumido no Teorema de PRO, em Chomsky
(1981): PRO não pode ser regido. Na
representação seguinte, vemos PRO, no seu uso
típico de sujeito de uma oração infinitiva, como
categoria vazia [+pronominal] e
[+anafórica]:
(10) [O João]1 quer [PRO1
comprar o livro do Chomsky ]
A relação que intuitivamente assumimos entre o
João e o sujeito de comprar em (10) é a de
co-referência, ou controlo, assinalada por
co-indexação, entre o pronome PRO e o NP sujeito
principal.
Em síntese, a TRL aceita quatro tipos de categorias vazias:
vestígios de NP, vestígios de Wh, pro e PRO.
Vemos assim que a noção de categoria vazia de Chomsky
(1981,1982) não contempla ainda a existência
--atestada-- de vários tipos de relações
anafóricas --no sentido mais amplo da palavra-- na
ausência de qualquer movimento, típicas da elipse.
Põe-se por isso a questão de saber se, nas frases
seguintes, haverá que referir os constituintes vazios
presentes em termos de elipse ou em termos de categoria vazia
anafórica:
(11)
a. Eu tenho lido muito, e tu
também tens [-]
b. O João leu a poesia camoniana e a [-] camiliana
c. O livro do João é interessante, mas o [-] da
Maria não é [-]
A observação destes exemplos permite concluir que
existe uma relação formal entre alguns dos
constituintes presentes e o constituinte vazio. Será o caso,
por exemplo, em (11c), em que podem ser restituídos
livro e interessante, a partir dos elementos anteriores
lexicalmente realizados. Crucialmente, o constituinte elíptico
revela as duas características seguintes: em primeiro lugar,
não corresponde a qualquer tipo de movimento de constituintes
--pelo que não é um vestígio--, e, em segundo,
pode ser recuperado a partir dos elementos efectivamente
realizados.
Os exemplos seguintes de
extracção de constituintes Wh em Inglês mostram
que os vestígios resultantes de uma extracção
devem obedecer a requisitos de um tipo particular:
(12)
a. Whati do [IP
you think [CP t'i that [IP
Paul will say ti]]]?
b. Whati do [IP you think [CP
t'i [IP Paul will say
ti]]]?
(13)
a. * Whoi do
[IP you think [CP t'i that
[IP ti will bring flowers ]]]
?
b. Whoi do [IP you think [CP
t'i [IP ti will bring
flowers ]]]?
Em (12), vemos que no caso de extracção longa
cíclica de um objecto, por Mover wh, o vestígio
ti em posição argumental, independentemente
da presença ou não de um COMP lexical, é regido
pelo verbo, sendo por isso tematicamente regido. Quanto ao
vestígio intermédio t'i, podemos ver que
é regido pelo constituinte "what" co-indexado.
Em (13), caso de extracção de sujeito, existe uma
assimetria relacionada com a realização ou a não
realização do COMP lexical that. A
diferença de gramaticalidade entre (13a) e (13b) tem sido
explicada de várias maneiras na Gramática Generativa:
na primeira representação, that intervem entre a
posição sujeito e o vestígio intermédio
em [Spec,CP]. Sendo assim, that é um regente
potencial, e tem a capacidade de reger IP e os seus constituintes,
incluindo a posição sujeito, o que é
indesejável. Claramente, o regente para o vestígio do
sujeito deveria ser o vestígio intermédio em
[Spec,CP], co-indexado com ele. Temos pois uma
situação com dois regentes potenciais, COMP e t', e a
frase é má, visto que that, regente mais
próximo do vestígio a reger, não rege
tematicamente --não tem papel temático a atribuir-- nem
rege por antecedente o vestígio do sujeito --não
estão co-indexados. Pelo contrário, na frase (13b),
não havendo COMP lexical, nada impede o vestígio
intermédio de reger a posição do sujeito.
Note-se também que em (13), o vestígio
intermédio em [Spec,CP] é em ambos os casos
regido pelo constituinte Who com ele
co-indexado.[38]
Pode-se portanto formular o ECP como um princípio de
legitimação dos vestígios: para serem
legitimados --isto é, para ocorrerem em determinada
posição--, os vestígios devem ser regidos de um
modo particular, devem ser estritamente regidos.[39]
Em Chomsky (1986a), a Regência Estrita --em Inglês
Proper Government[40]--
é definida no quadro das Barreiras como
Regência Temática --um núcleo marca
tematicamente o vestígio-- ou como Regência por
Antecedente--uma projecção máxima
co-indexada rege o vestígio:
(14) Princípio da Categoria
Vazia
Os vestígios devem ser estritamente regidos
(15) Regência Estrita
A rege estritamente B sse A rege tematicamente B ou A rege por
antecedente B
A rege tematicamente B sse A rege B e A marca tematicamente B
A rege por antecedente B sse A rege B e A está co-indexado com
B
Em (15), a regência estrita pode ser traduzida sintacticamente
de duas maneiras, a regência temática e a regência
por antecedente. A primeira é uma relação entre
uma categoria lexical e o seu complemento
subcategorizado[43],
e é relevante para os vestígios que podem estar
separados por uma grande distância do seu antecedente, no caso
de extracções longas, bastando para isso serem regidos
localmente por um núcleo lexical --capaz de atribuir papel
temático. Vejamos os exemplos seguintes, casos de
extracção do objecto curta e longa,
respectivamente:
(16)
a. Eu não sei
[CP [que livro]i é que
[IP o João comprou vi ]]
b. Eu não sei [CP2 [que
livro]i é que [IP2 o Pedro acha
[CP1 v'i que [IP1 o
João comprou vi
Em (16a), o vestígio vi encontra-se estritamente
regido, sendo regido tematicamente pelo verbo --é o seu
argumento interno--, pelo que o ECP é satisfeito e a frase
é boa. Note-se que mesmo em casos de extracção
longa --como em (16b)--, a frase continuaria a ser boa, na medida em
que o vestígio v seria sempre regido tematicamente.
Põe-se no entanto a questão do estatuto do
vestígio intermédio relativamente ao ECP. Assim, para o
vestígio v' em [Spec,CP1], assume-se que é
regido por antecedente pelo constituinte Q em [Spec, CP2], na
medida em que nem CP1 nem IP2 são barreiras: CP1 é
marcado lexicalmente pelo verbo achar, pelo que é um CP
transparente à regência, e IP2 é nó
irmão de C.
A Regência por Antecedente, por seu lado, impõe
condições de minimalidade. No exemplo seguinte, temos
um caso de NP sujeito submetido a Mover wh:
(17) Eu não sei [CP
quemi [IP vi comprou este
livro]]
Em (17), o vestígio v encontra-se devidamente regido
por antecedente pelo constituinte Q em [Spec,CP], não
sendo aqui IP uma barreira para a regência, já que
é irmã de C, e CP é marcada lexicalmente
[46].
Formalizam-se a seguir as noções de Regência
Temática e Regência por Antecedente (Chomsky 1986a):
(18) Regência
Temática:
± rege tematicamente β sse ± for uma categoria de
nível zero que marca tematicamente β, e ± e β
forem irmãos.
(19) Regência por Antecedente
A rege por antecedente B sse
(i) A e B são categorias co-indexadas.
(ii) A c-comanda B
(iii) Não existe nenhuma categoria Ä, Ä uma
barreira, tal que Ä exclui A e domina B.
O ECP é retomado por Rizzi (1990), no âmbito da
Minimalidade Relativizada. De acordo com este modelo, o
regente efectivo de um constituinte deve ser definido em
função do tipo de regência a considerar:
só uma categoria máxima pode ser barreira para uma
categoria máxima, e só um núcleo pode ser
barreira para um núcleo. Rizzi (1990:7) dá a seguinte
definição:
(20) Minimalidade Relativizada
X ±-rege Y se não houver nenhum Z tal que
(i) Z é um ±-regente potencial para Y e
(ii) Z c-comanda Y e não c-comanda X
em que ±=núcleo/antecedente
A condição de minimalidade, assim definida, permite
considerar outras estratégias para satisfazer a regência
estrita das categorias vazias, como ilustra o exemplo em
(21):[50]
(21) ? [CP2 Que
estudantei não sabes [CP1 que livros
de linguísticak [IP tem [SV
vi lido vk ]]]]?
Em (21), o vestígio do sujeito não é
estritamente regido --regido por antecedente-- devido a (20),
já que o constituinte em [Spec,CP1], que é o
antecedente do objecto directo, é um regente potencial mais
próximo. No entanto, a frase é relativamente
aceitável, pelo que, se lembrarmos que uma
violação do ECP implica sempre resultados fortemente
degradados, concluímos que outra maneira de recuperar a
categoria vazia vi deve existir nesta frase. Segundo Matos
(1992:42-43), a aceitabilidade relativa de (21) mostra que
vi é regido por algum núcleo próximo.
A estrutura de (21) sugere que a Regência Estrita pode ser
reformulada mais precisamente do que em (15), nomeadamente em termos
de Regência Estrita por Núcleo, já que,
crucialmente, "o vestígio do sujeito deslocado é
estritamente regido por FLEX".
A Regência Estrita por Núcleo, que reduz a
regência de um vestígio ao domínio de c-comando
do núcleo regente, é formulada em (22), e o ECP
é em consequência redefinido em (23):
[52]
(22) Regência Estrita por
Núcleo
Um núcleo Xº rege estritamente uma categoria ±, se
Xº reger ± no interior de X'.
(23) Princípio da categoria vazia
Uma categoria vazia não pronominal deve ser estritamente
regida por núcleo
(23) implica assim que o ECP deve ser doravante considerado a dois
níveis: o nível de legitimação formal das
categorias vazias, processada por meio da Regência Estrita por
Núcleo, e o nível da identificação do
conteúdo das categorias vazias, realizada por Regência
Temática ou Regência por Antecedente[55].
Concluímos, pois, que o princípio (14) e posterior
reformulação em (23), limita as categorias vazias a um
determinado tipo de configuração. Esta
definição contribui substancialmente para compreender a
natureza das categorias vazias: a regência estrita
impõe-se pelo facto de as categorias em questão serem
de algum modo incompletas, e precisarem de receber do seu contexto
imediato --definido justamente pela regência estrita-- as
propriedades que lhes faltam. Para as categorias vazias, que devem
ser interpretadas localmente, a noção de regência
define esse domínio mínimo e atribui-lhe a identidade
lexical que falta --por marcação temática ou por
co-indexação com uma categoria plenamente
identificada.
A noção de categoria vazia, definida em (14) e (23),
vem mostrar que faz todo o sentido falar de vazio num quadro em que
as categorias são identificadas em função das
suas propriedades linguísticas e não da sua
percepção directa: a ausência perceptiva
não equivale à ausência linguística
(Milner 1985). Para Raposo (1992:336), a identidade real
dessas categorias vazias não permite confundi-las com uma
ausência: "A conclusão de que existem tipos
diferentes de categorias vazias, com propriedades distintas e
restrições distribucionais diferentes, mostra
claramente que estamos face a entidades linguísticas reais,
que fazem parte da representação da linguagem na mente
do falante/ouvinte. [...] Uma categoria vazia não
é uma simples «ausência», porque uma
ausência não pode possuir propriedades diferenciadas.
Pelo contrário, uma categoria vazia é uma categoria
linguística real com uma matriz gramatical, embora sem matriz
fonológica."
A noção de categoria vazia reintroduz assim a antiga
relação entre a gramática e o vazio, mas agora
bastante distante da posição clássica, na medida
em que o elemento em causa não aparece mais como uma
ausência a suprir, um defeito a remediar, mas uma
condição de boa formação das
orações. Tanto a teoria dos vestígios --Chomsky
(1973)-- como a introdução do ECP em Chomsky (1981),
sucessivamente reformulado por vários autores, que postulam a
existência de elemento vazios, nulos do ponto de vista
fonético mas activos do ponto de vista sintáctico,
mostram a evolução do estatuto do imperceptível
linguístico. A importância que a noção de
categoria vazia introduz na análise da Sintaxe é a da
própria relação entre a linguagem e o vazio:
este deixa de ser uma lacuna, uma falta, a intuição de
uma ausência, um acontecimento exterior à própria
língua, para se tornar numa propriedade intrínseca da
estrutura sintáctica.
Mas como a exposição tem vindo a mostrar, no quadro
chomskyano continua a não haver um tratamento das categorias
vazias para além das aqui referidas: vestígios de NP,
vestígio de Wh, pro e PRO. Ora o problema crucial que
se coloca é saber se a teoria está preparada para dar
conta de categorias vazias como as que encontrámos nos
exemplos (11), entre outros. É o que vamos tentar perceber nos
parágrafos seguintes.